Os Cineastas e a sua Arte - Parte VI

O Cinema como Arte Técnica


"Admitamos em definitivo – como somos tentados a fazer – que o cinema seja uma arte. Precisamos então de encontrar o seu lugar no sistema das artes. Quando Tarkovski escreveu os seus pensamentos em Esculpir o Tempo, as relações do cinema com as outras artes ainda não estavam (alguma vez estarão) completamente esclarecidas e, eventualmente, nem sequer pacificadas, como se constata por estas palavras: “temos de deixar claro, de uma vez por todas, que se o cinema é uma arte, ele não pode ser simplesmente uma amálgama de princípios de outras artes” (Tarkovski, 64). É interessante que Tarkovski, ao falar no condicional, ainda questione se o cinema será uma arte, ele que se bateu tanto por uma definição dos princípios da arte (cinematográfica) enquanto tal, com a autenticidade acima de todos.
Temos, então, o cinema elevado ao topo do mundo e recaído entre as outras artes. Num momento, “o cinema subiu acima do nível do music-hall, do parque de diversões, do jardim zoológico e da câmara de horrores, para tomar seu lugar na família das grandes artes. O cinema parecia o mais alto estágio de personificação das potencialidades e aspirações de cada uma das grandes artes” (Eisenstein, 165). No outro, é uma arte influenciada pelas demais, sendo que “toda a história da cultura mundial contribuiu para a arte cinematográfica”. No horizonte do cinema encontramos sempre uma convergência possível ou desejável. E Eisenstein vislumbrou algo constantemente prometido, mais ambicioso, mais abrangente e, sempre, adiado: “está chegando o momento em que, não apenas através do método de montagem, mas também através da síntese da ideia, do drama do homem que representa, do retrato cinematográfico, do som, da tridimensionalidade e da cor, a mesma grande lei da unidade e diversidade passe para uma unidade de toda a imagem da tela” (Eisenstein, 219). Todos os meios de expressão a responderem a todos os sentidos – uma quimera, no seguimento de Wagner, apreciada por Eisenstein: o cinema como último passo em direção à obra de arte total.
Percebemos várias implicações: em primeiro lugar, que há uma diversidade grande de vínculos possíveis entre o cinema e as outras artes; em segundo lugar, que existe, por isso mesmo, uma grande quantidade de escolhas no que respeita às estratégias criativas; em terceiro lugar, que houve artes que precederam o cinema e que eventualmente lhe sobrevirão; em quarto lugar, que o próprio cinema poderá vir a sobreviver a si próprio sob novas formas, quem sabe, de novos cinemas. Transformar-se ou desaparecer: como arte? Como meio? Como linguagem? Como técnica?"


Luís Nogueira, pags. 24 a 31

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