Os Cineastas e a sua Arte - Parte IV

História dos Cineastas

"De algum modo valerá a pena questionarmo-nos também sobre a possibilidade de uma história dos cineastas, isto é, de uma história das suas relações com o cinema. Propomos aqui cinco momentos:
No momento da inquietação, englobamos, entre outras iniciativas e intervenientes, as especulações teóricas e criativas das vanguardas impressionistas e soviéticas. O objetivo era então saber o que e como se faz no cinema, como entendê-lo, onde o colocar, para que serve?
O momento da estabilização corresponde ao período clássico, o período dos estúdios e da sua organização milimétrica, das estrelas e do seu ascendente de glamour, dos gêneros e das suas convenções e paradigmas.
A renovação responde ao, e desafia, o esgotamento do classicismo. Surgem novos olhares, reinventam-se gêneros, instauram-se movimentos e mandamentos.
Com o cinema de autor o aprofundamento da reflexão torna-se evidente: o que é verdadeiramente o cinema enquanto arte? O que permite ele em termos de expressão? Como pode o cinema dar voz e visão à complexidade da mente, da alma, da religião, do mundo? Há um universo interior e pessoal que se quer exprimir através do cinema – nem ficção, nem política, nem guerra, nem fantasia; é o momento de um desdém pela narrativa, ainda que o autor queira quase sempre contar uma história – a sua; a profundidade emocional e a sofisticação intelectual tornam-se o Graal cinematográfico; pratica-se um cinema culto, com algo de elegíaco, em certos casos, com algo de utópico, noutros; cada filme (ou, pelo menos, cada autor) parece possuir, propor e defender uma teoria (do cinema ou da vida); a densidade filosófica e literária é uma marca de erudição.
E então, depois da profundidade, a proliferação impera. Chega-se ao momento em que tudo se torna leve. Em que tudo se torna vulnerável. Em que tudo se torna profano. Em que tudo se desmembra. Em que tudo se dissolve. Em que tudo se relativiza."

Teoria do estilo/Estilo como teoria

"Podemos entender o estilo como o modo de fazer, a forma de operar os instrumentos de uma linguagem ou qualquer meio de expressão artística. Será no modo de fazer que devemos, assim, procurar compreender o estilo. No nosso caso, trata-se de compreender o modo de (alguém) fazer um filme.
Daí que o próprio estilo de um cineasta possa ser, de algum modo, visto como uma sentença, uma especulação ou mesmo uma reflexão sobre o que seja o cinema. O modo de fazer transporta sempre um entendimento estético ou um valor ético do procedimento artístico. Uma concepção ou uma ideia de cinema, se quiser. É nesse sentido que nos referimos ao estilo como teoria.
Como se constata, a definição revela-se uma tarefa de extrema dificuldade. Mas não nos deixemos enganar: o estilo é a melhor produção teórica de qualquer artista. É através dele que descobrimos as ideias do seu cinema ou o cinema ao serviço das suas ideias – e avaliamos a profundidade, a convicção, as insuficiências, os triunfos; que descobrimos como o cineasta se relaciona com as matérias, as técnicas, as tradições, os temas que compõem as práticas e as teorias cinematográficas. Se os gêneros nos garantem um nível mínimo de competência e de cultura cinematográfica, o estilo há de revelar-se o índice do talento de um autor. A excelência ou a extravagância, o respeito ou a iconoclastia, a ironia ou a reverência: um estilo pode medir-se e desenhar-se segundo vários critérios. Ainda assim, algo nos parece irrefutável: as convenções podem ser ensinadas, o estilo tem que ser inventado – e ao ser inventado, ele supera, depura ou rompe com as convenções: em qualquer caso, move-as. O pastiche, o maneirismo e a paródia seriam o grau mínimo do estilo. A originalidade, a sua ambição mais fecunda."

Luís Nogueira, pags. 13 a 18

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